Alterações de percepção: características principais

As alterações de percepção variam de ilusões a alucinações em todas as suas modalidades, e podem ser causadas por alterações orgânicas ou emocionais. A seguir explicaremos em detalhes as principais alterações de percepção.
Alterações de percepção: características principais
Bernardo Peña

Escrito e verificado por el psicólogo Bernardo Peña.

Última atualização: 08 setembro, 2021

Neste artigo abordaremos as principais alterações de percepção. A percepção é um processo sensocognitivo no qual as coisas se manifestam como tais em um ato de experiência. Neste processo, são extraídas informações externas sobre o ambiente que nos rodeia para que em seguida sejam realizadas as interpretações internas.

Para alguns autores, a percepção é mais do que um processo sensocognitivo. Em vez disso, é uma função da psique, por meio da qual as informações são capturadas e identificadas, tanto do mundo externo quanto da própria corporeidade.

As alterações de percepção são problemas quando se trata de identificar e reconhecer corretamente esses estímulos.

Percepção humana: uma breve introdução

A percepção, portanto, é o processo que nos permite conhecer a realidade. Para que este processo se concretize, é fundamental o correto funcionamento das estruturas sensoriais periféricas, que se encarregam de obter e disseminar informações do meio externo para as áreas sensoriais primárias.

As áreas sensíveis primárias, por sua vez, se encarregam de conduzir essas informações às áreas cerebrais secundárias, cuja função é realizar os processos de recepção, filtragem e organização da informação, relacionando-a e fazendo uma interconexão com a memória e os instintos da pessoa. Alterações nessas áreas provocam alucinações e agnosia, entre outras condições.

O processo de percepção está totalmente relacionado à subjetividade e à objetividade, pois quando as informações são interpretadas na mente de cada pessoa intervêm elementos subjetivos, enquanto o objeto externo que ocupa um lugar no espaço real é diretamente objetivo.

Com base nisso, fica claro que o processo de percepção não é um retrato totalmente objetivo do mundo exterior, uma vez que esse processo não se baseia apenas nos dados obtidos, mas em elementos que diferem de pessoa para pessoa, como suas experiências, ideologias, julgamentos ou ideias, entre outros.

Criança com autismo.

Alterações de percepção: questões preliminares

As alterações de percepção tendem a ser classificadas em dois grupos. Entre eles estão:

  • Distorções perceptivas: ocorrem quando o indivíduo percebe as características de um elemento de forma diferente da esperada. Exemplos de distorções podem ser uma percepção diferente de tamanho (macropsia ou micropsia), forma (dismorfopsia) ou intensidade (hiperestesias-hipoestesias), entre outros.
  • Engano perceptivo: ele se distingue porque o estímulo que o causa não tem uma existência real. Além disso, ele coexiste com o resto das funções perceptivas que são normais.

Principais alterações de percepção

Entre as principais alterações de percepção estão a ilusão, alucinação, pseudopercepções, distúrbios de sensibilidade e dismorfose.

Alterações de percepção: ilusão

Uma ilusão é uma ideia errônea gerada por uma transformação das percepções reais, em decorrência da influência de um estado emocional que altera a informação obtida. De forma que, ao ser percebida e interpretada, ela é alterada.

Com base nisso, pode-se dizer que ilusões são percepções que não correspondem às características reais dos estímulos. Portanto, está claro que a ilusão é uma percepção distorcida. Ou seja, o que é observado, ouvido ou sentido está sendo distorcido.

Entre as principais características das ilusões, encontramos:

  • A ilusão precisa de encorajamento. Além de ser uma característica muito importante, é a principal diferença entre uma ilusão e uma alucinação. Na ilusão deve haver um estímulo real, pois o que causa a ilusão é a percepção errônea desse estímulo. Se ele não existisse, não seria mais uma ilusão, mas sim uma alucinação.
  • Outra característica das ilusões é que a pessoa sabe ou está em condições de entender que o que ela percebe não é algo totalmente real, mas sim distorcido.
  • As ilusões tendem a ocorrer com frequência e em muitas situações.

As ilusões podem ser classificadas de acordo com o fator etiológico:

Ilusões por falta de atenção

Essa ilusão é apresentada como um mecanismo usado pelo cérebro humano para facilitar a compreensão do ambiente. Assim, quando a pessoa não capta todas as informações, ela tende a complementá-las com o acontecimento lógico da sequência.

Por exemplo, uma pessoa que vê uma cena de um casal se beijando, e a próxima cena são eles nus na cama. Com base nisso, ela assume eventos que não observou, como que eles tiraram a roupa e fizeram sexo.

Ilusões afetivas

Nessas ilusões, as circunstâncias criam estados de ânimo em que a pessoa altera a informação real. Por exemplo, uma menina com medo de ficar sozinha em casa, quando está nesta situação, tenderá a ver um ladrão na sombra de objetos como casacos, móveis, etc.

Pareidolias

Relacionam-se da mesma maneira com as emoções, mas de forma mais afetiva, na qual as pessoas atribuem características físicas de rostos ou acreditam ver rostos em objetos como nuvens.

Percepção delirante

O ambiente é interpretado de um ângulo muito peculiar, dependendo do tom hedônico de quem o percebe. Essa percepção é produzida por drogas alucinógenas ou por efeito de um transtorno psicótico.

O que pode causar uma ilusão?

Entre os fatores que podem causar uma ilusão estão:

  • Esperar um acontecimento. Por exemplo: esperar uma mensagem no celular.
  • Quando são pessoas altamente sugestionáveis. Por exemplo: pessoas que ao entrarem em um cemitério já acreditam ouvir vozes ou ver sombras.
  • Em estados emocionais intensos. Por exemplo: ilusões emocionais catatímicas (estados de hiperatividade devido a situações de medo).
  • Excesso de fantasia. Por exemplo: ilusões pareidólicas (percepção distorcida que a pessoa não consegue controlar, o que é percebido é possui nitidez e clareza).
  • Em estados de necessidade. Por exemplo: quando em um filme o protagonista está no deserto, sem água, etc.
  • Quando há falta de informação.
Esquizofrenia.

Alteração de percepção: alucinação

Na alucinação o indivíduo está convencido de haver percebido um estímulo, porém, ele não existe. A alucinação é caracterizada por perceber o estímulo de forma muito nítida, pois a pessoa realmente acredita na existência do mesmo.

Além disso, ela mantém uma percepção objetiva em relação a outros estímulos reais. Um exemplo claro de alucinação seria uma pessoa que vê um indivíduo que se move e acena para ela em um lugar onde não há ninguém. Perceber algo sem um estímulo, portanto, é uma alucinação, neste caso visual.

A alucinação é uma característica muito marcante do transtorno mental. A imagem típica socialmente criada é aquela na qual uma pessoa “louca” é aquela que afirma observar ou ouvir coisas que ninguém mais pode.

No entanto, uma alucinação não é produzida apenas por um transtorno mental. Ela também pode ser causada por situações com estímulos peculiares, consumo de drogas alucinógenas, epilepsia ou febre, entre outras causas.

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Classificação das alucinações

As alucinações tendem a ser classificadas em três variáveis diferentes: de acordo com o grau de complexidade, o conteúdo e a modalidade sensorial com a qual são apresentadas.

Vale ressaltar que, para realizar uma análise ou diagnóstico com base nessa classificação, as variáveis devem ser analisadas de forma integrativa; ou seja, observando todos os fatores.

  • De acordo com sua complexidade: nas alucinações complexas percebe-se o estímulo concreto; ou seja, se um objeto for presenciado, será percebido como muito detalhado. Enquanto isso, nas alucinações elementares, o objeto é visto de forma difusa.
  • De acordo com seu conteúdo: o conteúdo que as alucinações podem abarcar é infinito. No entanto, ele pode ser englobado em temas centrais, como as necessidades do indivíduo, lembranças, medos ou desejos, entre outros. Também pode ser o conteúdo do ambiente da pessoa, como a influência das suas ideologias que criariam insegurança ou vergonha, ou as circunstâncias vitais e extremas da pessoa.
  • De acordo com a modalidade sensorial: refere-se à forma como a alucinação é evidenciada. Na maioria das alucinações, elas ocorrem de forma visual ou auditiva.

Tipos de alucinações

Os tipos de alucinações se referem à modalidade sensorial em que ocorrem.

Alucinações visuais

Uma alucinação visual é aquela que ocorre por meio da visão. Ela possui as seguintes subdivisões com base no tamanho, tema, etc.

  • De acordo com o tema. Alucinações relacionadas a um tópico específico:
    • Zoopsias: alucinações relacionadas a insetos.
    • Delirium tremens: alucinações relacionadas a uma infinidade de temas, causada pela síndrome de abstinência do álcool.
  • De acordo com o tamanho. Alucinação onde as coisas são maiores ou menores:
    • Liliputianas – Os objetos parecem minúsculos ou menores do que o normal.
    • Guliverianas – Os objetos parecem enormes ou maiores do que o normal.
  • De acordo com as qualidades:
    • Intensidade: muito borrada ou muito densa.
    • Cor: alucinações em tons de cinza, em uma única cor, transparente, etc.
    • Movimento: alucinações estáticas ou em movimento.
    • Extensão: o espaço que ocupa. Por exemplo: uma sala de aula cheia de gente que não fala.
    • Posição: ver as coisas onde elas não estão. Por exemplo: ver um papagaio em um pico.
    • Binoculares ou monoculares: com um ou ambos os olhos.
    • Congruência ou incongruência: alucinações congruentes são as que estão relacionadas com a realidade e incongruentes quando não são consistentes com a mesma. Por exemplo: um trem voador ou um cachorro de bicicleta.
Alucinações de álcool.

Existem alucinações visuais relacionadas ao corpo do indivíduo; elas são chamados de autoscopia. Entre elas está a autoscopia interna, que ocorre quando uma pessoa vê o interior do próprio corpo, por exemplo: veias, ossos, vísceras, etc.

Também encontramos a autoscopia externa, que ocorre quando alguém vê a imagem de si mesmo à sua frente. Por fim, temos a autoscopia negativa que ocorre quando alguém não se vê ou não vê a própria imagem refletida num espelho.

Alucinações auditivas

Alucinações auditivas são aquelas cuja canal é a audição. Ou seja, nessas alucinações a pessoa ouve um estímulo inexistente. Este tipo de alucinação é a mais comum, juntamente com as alucinações visuais.

As alucinações auditivas são classificadas de acordo com o seu grau de complexidade. Elas podem se apresentar como elementares, na qual a pessoa ouve sons, passos ou murmúrios, ou como complexos, onde a pessoa ouve palavras claras e com significado.

Entre as variáveis para subdividir este tipo de alucinações estão:

  • Clareza: a clareza com a qual o som é percebido.
  • Intensidade: a magnitude desse estímulo irreal. Por exemplo: sussurros ou gritos, entre outros.
  • Localização: a distância em que ele é percebido (perto, longe).
  • Conteúdo: estímulos simples ou complexos. Por exemplo:
    • Reveladores de certas informações: a pessoa ouve vozes que lhe dizem coisas como onde está a bengala do seu avô.
    • Vozes que perguntam.
    • Vozes que dão ordens.
    • Comentários sobre os atos que são realizados.
    • Propostas eróticas grosseiras.
    • Vozes ameaçadoras.
Alucinações olfativas

São alucinações em que a pessoa sente cheiros que vão de agradáveis a nauseantes. É comum que elas estejam associados a envenenamentos, tumores cerebrais ou quadros clínicos em que as pessoas acreditam estar sendo envenenadas, entre outros. Desse modo, os pacientes consideram que esses odores os agridem, ou consideram que fazem parte de uma perseguição que busca prejudicá-los.

Alucinações gustativas

Esse tipo de alucinações cria nos pacientes a experiência de sabores desagradáveis. Elas estão relacionadas à crenças de envenenamento. É difícil saber o que realmente é uma alucinação, porque na vida diária tomar ou comer alguns medicamentos ou alimentos pode alterar o sabor dos mesmos. Em alguns casos, eles podem ser causados pelo próprio corpo, no qual o indivíduo atribui a ideia de estar apodrecendo por dentro.

Alucinações táteis

Essas alucinações podem ocorrer por todo o corpo. A pessoa pode sentir beliscões, toques, correntes elétricas ou queimaduras, entre outros. Desta forma, dependendo do conteúdo de cada alucinação, pode-se distinguir os seguintes tipos:

  • Háptica: sensação física (formigamento).
  • Hídrica: sensação de umidade.
  • De contato: toque.
  • Cinestésica: quando um indivíduo diz que uma parte de seu corpo está se movendo. É determinada por outra sensação subjetiva que afeta um sentido diferente.
  • Ativa: quando a pessoa tem a sensação de toque, ou seja, acredita, por exemplo, que tocou um objeto inexistente, como ter a sensação de tocar em insetos, etc.
  • Passiva: quando a pessoa tem a sensação de ser tocada. O paciente acredita que alguém ou algo que o está tocando, queimando ou espetando.

Pseudopercepções ou imagens anormais

Pseudopercepções ou imagens anormais são alterações perceptivas que não correspondem às características que vimos até agora. Essas imagens anormais podem ser consideradas imagens e podem ser produzidas na ausência de estímulos. Elas também podem ser ativadas mesmo quando o estímulo que as originou não estiver mais presente.

Dentro das pseudopercepções, se encontram os seguintes tipos:

  • Imagens hipnopômpicas e hipnagógicas: ocorrem em estados de semiconsciência, em que a pessoa se encontra entre o sono e a vigília. As imagens hipnopômpicas se originam quando a pessoa acorda. As imagens hipnagógicas se originam quando a pessoa entra no sonho, entre a vigília e o sonho. Ambas imagens são autônomas, pois aparecem sem que o indivíduo possa controlá-las.
  • Imagens alucinóides: caracterizam-se por serem autônomas e subjetivas e por se apresentarem sem a presença do estímulo que as ativa. Originam-se internamente, quando ocorrem o ‘espaço negro dos olhos fechados’, cuja causa é atribuída à febre de altíssima temperatura ou ao consumo de drogas alucinógenas. A pessoa está ciente de que essas imagens são criadas por sua mente e não existem na realidade.
  • Imagens mnémicas: essas imagens estão relacionadas às memórias de cada pessoa, que se transformam a partir dos desejos de cada um. Elas se caracterizam por serem criadas e mantidas voluntariamente.
  • Imagens consecutivas ou pós-imagens: são conhecidas como pós-imagens por serem apresentadas após uma alta carga de informações sensoriais. Um exemplo claro desse tipo seria a imagem de cor escura após a pessoa observar uma imagem de cor branca intensa.
As alterações de percepção variam de ilusões a alucinações em todas as suas modalidades, e podem ser causadas por alterações orgânicas ou emocionais.

Transtornos de sensibilidade

Os transtornos de sensibilidade são alterações na percepção que ocorrem na intensidade dos estímulos. Três podem ser diferenciados:

  • Hiperestesia: o estímulo é percebido de forma mais intensa do que realmente é. Ou seja, ocorre uma intensificação para que sons ou cores, entre outros, sejam percebidos de forma mais nítida. Um exemplo claro seria uma porta que se fecha sem ser batida e sem ruído excessivo, mas a pessoa ouve um ruído estrondoso e extremamente alto.
  • Hipoestesia: o estímulo é percebido de forma menos intensa do que realmente é, pois ocorre um enfraquecimento da percepção. Na verdade, as cores tendem a parecer escuras, a comida sem gosto, entre outros.
  • Anestesia: relacionada ao toque, não há mais sensação tátil. Além disso, as terminações nervosas que medeiam a dor são “desligadas”.

Dismorfoses

As dismorfoses são produzidas por uma distorção do estímulo. Ele é percebido como distorcido, mas a pessoa reconhece que o estímulo existe e que é ela quem o percebe de forma diferente. São distinguidos os seguintes:

  • Macropsia: o estímulo aparece ampliado por completo ou em alguma parte significativa.
  • Micrópsia: o estímulo parece diminuído em sua totalidade ou em alguma parte significativa.
  • Excisão perceptiva: o estímulo fica tão distorcido que não é mais reconhecido que o estímulo existe.
  • Aglutinação de percepção: Os estímulos são aglutinados a ponto de se formarem como um único estímulo.

Conclusões

Em conclusão, a percepção é um processo cognitivo fundamental que nos ajuda a reconhecer o ambiente externo e interno que nos rodeia, com base em nossa experiência prévia.

As alterações de percepção, de alguma forma, nos alienam do contexto que nos rodeia. Portanto, dada a gravidade de algumas das modalidades em que eles ocorrem, é necessário abordá-las do ponto de vista psicológico ou médico.



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