Transtornos do espectro alcoólico fetal: em que consistem?

Os transtornos do espectro do álcool fetal (TEAF) incluem uma variedade de transtornos decorrentes do uso de álcool pela mãe durante a gravidez. Acarretam sintomas cognitivos, psicológicos e comportamentais, em graus muito variados. Vamos falar tudo sobre os TEAF.
Transtornos do espectro alcoólico fetal: em que consistem?
Laura Ruiz Mitjana

Escrito e verificado por la psicóloga Laura Ruiz Mitjana.

Última atualização: 04 maio, 2021

Os transtornos do espectro alcoólico fetal (TEAF) aparecem em um bebê quando a mãe consume álcool, em maior ou menor grau, durante a gravidez. Nos países ocidentais, os TEAF ocorrem em 0,5-2 casos por 1.000 nascimentos. Na Espanha, por exemplo, estaríamos falando de 2 casos para cada 1.000 nascimentos.

Trata-se de um grupo de transtornos que causam diversas alterações no desenvolvimento do bebê em nível cognitivo e comportamental. As crianças com TEAF geralmente apresentam dificuldades intelectuais, bem como problemas comportamentais e de aprendizagem.

O que mais sabemos sobre esses transtornos? Quais são os seus sintomas, causas e fatores de proteção? Como eles podem ser tratados?

Transtornos do espectro alcoólico fetal: em que consistem?

Os transtornos do espectro alcoólico fetal são complexos.
O consumo de álcool é prejudicial ao desenvolvimento dos fetos.

Os transtornos do espectro alcoólico fetal (TEAF) incluem uma série de condições que podem ocorrer em uma pessoa cuja mãe consumiu álcool durante a gravidez. Conforme veremos, existem diferentes tipos de TEAF, cada um com características definidoras bastante claras.

As condições podem ser de diferentes tipos e graus nos TEAF e incluem efeitos ou sintomas como problemas físicos, deficiência intelectual e problemas comportamentais e de aprendizagem. Genericamente, alguém com TEAF apresenta uma combinação de todos esses sintomas.

Sintomas

Quais são os sintomas ou sinais de transtornos do espectro alcoólico fetal? Conforme já dissemos, eles incluem uma ampla variedade de efeitos, que podem ser desde leves até graves.

Assim, uma pessoa com TEAF pode apresentar diversos tipos de sintomas. De acordo com os Centros de Controle e Prevenção de Doenças (CDC), eles são os seguintes:

Sintomas médicos ou físicos

  • Baixo peso ao nascer (e baixo peso corporal ao longo da vida).
  • Baixa estatura.
  • Cabeça com tamanho pequeno.
  • Dificuldade para dormir.
  • Problemas de sucção quando bebê.
  • Problemas de audição e visão.
  • Problemas de coração.
  • Problemas renais.
  • Problemas ósseos.
  • Características faciais anormais (por exemplo, um sulco menos marcado entre o nariz e o lábio superior, chamado de sulco subnasal).

Sintomas cognitivos

  • Problemas de aprendizagem.
  • Dificuldades ou distúrbios de memória.
  • Atrasos na fala e linguagem.
  • Deficiência intelectual, que pode variar de leve a grave.
  • Dificuldade de julgamento ou raciocínio.
  • Problemas de atenção ou concentração.

Sintomas comportamentais

  • Sintomas de hiperatividade ou de transtorno do déficit de atenção com hiperatividade (TDAH).
  • Má coordenação motora.
  • Distúrbios comportamentais.
  • Sensação de hiperativação constante ou “alerta”.

Sintomas psicológicos ou emocionais

Em alguns casos, os TEAF também podem levar a alterações na área emocional da pessoa:

Tipos de transtornos do espectro alcoólico fetal

Existem diferentes tipos de transtornos do espectro alcoólico fetal, de acordo com as suas características e o tipo de sintoma predominante.

Síndrome alcoólica fetal (SAF)

Talvez seja a mais conhecida; representa o extremo mais grave dos distúrbios do espectro alcoólico fetal (embora não seja o mais comum). As pessoas afetadas podem ter características faciais anormais, distúrbios de crescimento e problemas com o sistema nervoso central.

Além disso, também podem apresentar deficiência intelectual (em diferentes graus), problemas de aprendizagem e memória, problemas de atenção, comunicação, visão e/ou audição. São pessoas que geralmente têm problemas desde muito jovens, na escola.

Outras alterações

Também podem ter dificuldade para se dar bem com as outras pessoas ou para se relacionar com os outros. Assim, independentemente do grau de envolvimento anatômico do cérebro da criança, no caso da SAF, sempre serão observadas alterações cognitivas ou comportamentais.

A SAF é a principal causa teratogênica de deficiência intelectual, atrás apenas da síndrome de Down e da síndrome do X frágil.

Transtorno do neurodesenvolvimento relacionado ao álcool

Neste caso, estamos falando de pessoas com deficiência intelectual e problemas comportamentais e de aprendizagem. Talvez o seu desempenho acadêmico ou escolar seja adequado, e elas apresentem dificuldades apenas na área de matemática e dificuldades de memória e raciocínio. Elas também podem ter pouco ou nenhum controle dos seus impulsos.

Defeitos congênitos relacionados ao álcool

Incluem sintomas ou efeitos como problemas cardíacos, renais, ósseos ou auditivos.  É provável que as pessoas com essa condição apresentem uma combinação desses sintomas.

Transtorno neurocomportamental associado à exposição pré-natal ao álcool

Em 2013, esse transtorno foi incluído pela primeira vez como uma condição reconhecida no DSM-5 (Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais). Uma criança ou um jovem com este transtorno neurocomportamental apresentará problemas em três áreas principais:

  • Pensamento e memória: problemas para planejar, esquecer informações já aprendidas…
  • Comportamental: diversas alterações comportamentais (acessos de raiva, irritabilidade, rigidez mental…).
  • Funcionamento cotidiano: dificuldades para realizar as atividades da vida diária de forma autônoma.

Para que esse diagnóstico possa ser feito, a mãe do bebê deve ter consumido mais do que níveis mínimos de álcool antes do nascimento da criança.

De acordo com a APA (Associação Americana de Psiquiatria), esses níveis seriam mais de 13 doses de bebidas alcoólicas durante um mês da gravidez (ou seja, qualquer período de 30 dias durante a gravidez), ou mais de duas doses na  mesma ocasião.

Causas

Os transtornos do espectro alcoólico fetal ocorrem em uma pessoa porque a sua mãe consumiu álcool durante a gravidez. Dessa forma, o álcool no sangue da mãe é transmitido ao bebê através do cordão umbilical. Logicamente, isso tem um impacto importante no bebê, que ainda está em desenvolvimento e é vulnerável nesse sentido.

Por outro lado, não existe uma quantidade “segura” de álcool que possa ser consumida durante a gravidez, ou que ao menos se conheça com exatidão. Além disso, não há nenhum momento durante a gravidez em que a mãe possa beber sem que isso represente um risco para o filho.

Desta forma, sabemos que o álcool é capaz de causar problemas ao feto em qualquer fase da gravidez (até mesmo antes de que a mulher saiba que está grávida). Nesse sentido, qualquer tipo de álcool é prejudicial durante a gravidez (sejam vinhos, cervejas, bebidas “fortes”…).

Prevenção

Os transtornos do espectro alcoólico fetal podem ser evitados.
O controle pré-natal adequado é essencial.

A prevenção dos transtornos do espectro do alcoólico fetal envolve não consumir nada de álcool durante a gravidez. Ele também não deve ser consumido enquanto se busca essa gravidez, pois pode acontecer que a mulher não saiba que está grávida até a 4ª ou 6ª semana de gestação (assim, o álcool faria mal ao bebê da mesma forma).

Embora seja melhor nunca consumir álcool durante a gravidez para evitar um possível TEAF, se a mulher começou a beber durante a gravidez, nunca é tarde para parar. É melhor deixar o álcool no começo do que no final, porque haverá menos risco para a saúde e o desenvolvimento do bebê.

Tratamento

Os transtornos do espectro alcoólico fetal não têm cura, ou seja, permanecem durante toda a vida. No entanto, estudos indicam que programas de estimulação precoce podem beneficiar o desenvolvimento dessas crianças.

O ideal será optar por um tratamento multidisciplinar, através do qual a criança seja tratada de forma integral. Isso inclui abordar os seus problemas cognitivos, psicológicos, emocionais, comportamentais ou médicos a partir de diferentes perspectivas.

Na área psicológica, são propostos tratamentos focados na estimulação das capacidades de aprendizagem preservadas (por exemplo: programas de estimulação cognitiva), técnicas de modificação do comportamento, psicoeducação para os pais, etc.

Fatores de proteção

De acordo com os estudos de Streissguth et al. (2004), há uma série de fatores de proteção para esse tipo de transtorno, que seriam:

  • Um diagnóstico antes dos 6 anos de idade.
  • Um ambiente e um lar estável e amoroso.
  • Um ambiente enriquecedor e estimulante durante os anos escolares.
  • Um ambiente livre de violência.
  • Acesso à educação especial e aos serviços sociais.

Os transtornos do espectro alcoólico fetal são transtornos que podem ser leves ou graves, mas que geralmente são complexos porque afetam a pessoa para o resto da vida. Por isso, a prevenção nesses casos é fundamental e pode ser feita por meio da abstenção do consumo de álcool durante a gravidez.

Embora não haja cura para esse tipo de transtorno, os seus sintomas podem ser tratados por meio de um tratamento multidisciplinar. Assim, é possível melhorar a qualidade de vida dessas pessoas e o seu desenvolvimento em nível cognitivo, emocional e social. Por outro lado, é recomendável procurar grupos de apoio e pedir ajuda profissional  caso essa experiência seja vivenciada por uma criança.



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