CRISPR (Repetições Palindrômicas Curtas Agrupadas e Regularmente Interespaçadas)

A engenharia genética está cada vez mais na ordem do dia, mas é necessário um longo período de pesquisa e uma legislação rigorosa para que ela possa ser aplicada aos seres humanos. O sistema CRISPR se enquadra nesse contexto e nós lhe contaremos tudo sobre sua utilidade.
CRISPR (Repetições Palindrômicas Curtas Agrupadas e Regularmente Interespaçadas)
Samuel Antonio Sánchez Amador

Escrito e verificado por el biólogo Samuel Antonio Sánchez Amador.

Última atualização: 07 junho, 2023

Genética, engenharia genética, transgênicos e muitos outros termos relacionados à herança estão na boca de todos há alguns anos. Infelizmente, a desinformação muitas vezes leva ao medo. O mundo da modificação do DNA está envolto em uma aura de desconfiança e considerações éticas, que envolve o sistema CRISPR ( acrônimo de Clustered Regularly Interspaced Short Palindromic Repeats , em português: Repetições Palindrômicas Curtas Agrupadas e Regularmente Interespaçadas).

Apesar dessas reservas, a verdade é que o ser humano intervém há centenas de anos na constituição genética dos seres vivos que o cercam. Basta olhar para um buldogue e um chihuahua para descobrir que as raças de cães – e muitas outras espécies domésticas – passaram por um sofisticado processo de seleção ao longo dos séculos.

Além das considerações éticas e abordagens morais —que também exploraremos—, o ponto de partida para qualquer debate encontra-se no conhecimento. Por isso, hoje mostramos a você todas as informações essenciais sobre o sistema CRISPR/Cas, uma ferramenta molecular que permite ao ser humano editar o genoma de qualquer célula.

Antecedentes do CRISPR

Antes de mergulhar totalmente no mecanismo de ação dessa ferramenta emocionante, achamos necessário contextualizar sua descoberta em um quadro histórico. A verdade é que a edição de genes remonta à década de 1970, usando o método de reparo por recombinação homóloga (HDR).

Embora não queiramos incorrer no processo exato dessas ferramentas complexas, podemos destacar que são sistemas caros, complexos que não garantem, em muitos casos, uma operação eficiente. De nucleases de dedo de zinco  à tecnología de TALENs (transcription activator-like effector nucleases), muitos exemplos de edição de genes foram demonstrados ao longo das décadas.

Apesar dessa ampla gama de opções, a descoberta da tecnologia CRISPR/Cas em 1987 foi uma verdadeira revolução. Por quê?

O que é CRISPR/Cas?

Embora seja um mecanismo bastante complexo que requer certo conhecimento genético para ser compreendido, vamos tentar definir seu funcionamento em poucas linhas.

Antes de tudo, é preciso definir cada um dos dois termos que dão nome ao sistema CRISPR/Cas:

  • CRISPR: de acordo com portais informativos, esta terminologia refere-se a “repetições palindrômicas curtas agrupadas e regularmente espaçadas”, ou seja, regiões de DNA com sequências repetidas.
  • Genes Cas: eles estão localizados próximos a essas sequências e estão relacionados às matrizes de repetições CRISPR. Eles contêm informações genéticas que codificam enzimas essenciais do sistema. De especial interesse é a enzima Cas-9 nuclease, como veremos nas próximas linhas.

Assim, os CRISPRs são regiões do DNA em bactérias caracterizadas por sua repetitividade. Por outro lado, os genes Cas são uma espécie de “guardiões” que codificam informações para a síntese de enzimas, responsáveis por cortar e consertar falhas no DNA.

Dupla hélice de DNA.
O DNA pode ser cortado por várias técnicas e entre elas temos o novo mecanismo CRISPR.

Como funciona?

Os vírus, ao infectarem essas bactérias, introduzem suas informações genéticas em seu citoplasma. Felizmente, a bactéria tem um mecanismo de defesa. Ao produzir enzimas codificadas nos genes Cas, essas bactérias incluem parte da informação genética do vírus em seu próprio genoma — na região CRISPR.

Podemos resumir o que vimos até agora no seguinte conceito: um vírus entra em uma bactéria e libera sua informação genética → a bactéria sintetiza enzimas a partir dos genes Cas → a bactéria sequestra o genoma do vírus e o inclui em seu próprio.

Por que a bactéria está interessada em integrar parte do genoma do vírus ao seu? A resposta é simples: imunidade. Na segunda vez que um vírus da mesma espécie atacar esse microrganismo, uma curiosa resposta biológica será dada:

  1. As regiões CRISPR – ao longo do ácido nucleico do vírus embutido nelas – são copiadas para pequenas moléculas de RNA.
  2. Essas moléculas se ligam à enzima Cas9 nuclease, orientando o complexo a se ligar ao ácido nucléico do novo vírus, por meio da identificação da sequência complementar.
  3. Cas9 corta a sequência de ácido nucleico do vírus que foi alvo.
  4. O vírus, por meio desse mecanismo, perde sua capacidade patogênica.

Resumindo: salvar uma parte da informação genética do vírus dá à bactéria a capacidade de inativá-la em ocasiões futuras. Esse tipo de memória genética permite que os microrganismos combatam os patógenos de forma eficaz.

Como nós, humanos, podemos tirar proveito desse mecanismo?

A verdade é que essa tecnologia é ideal para edição de DNA. Segundo artigos de revisão, todo esse processo complexo começa com a concepção de um RNA guia que será inserido na célula. Em geral, podemos resumir o intrincado trabalho da engenharia genética em algumas etapas:

  1. O RNA guia projetado está associado à enzima nuclease Cas9 descrita acima. Esse RNA específico é análogo a uma sequência de DNA dentro da célula, aquela que estamos interessados em mudar.
  2. Dependendo da complementaridade dos nucleotídeos —cada uma das subunidades que compõem o RNA e o DNA— o RNA guia e o trecho de DNA celular de interesse se hibridarão, ou seja, se unirão.
  3. Cas9 então atua cortando a região do DNA de interesse. O RNA é o cão-guia que rastreia onde cortar, e a Cas9, como a enzima que é, trabalha onde pertence.
  4. De acordo com processos complexos, uma nova sequência de DNA pode ser integrada no local do corte.

Assim, o DNA nuclear da célula está sendo modificado diretamente. Parte de sua informação genética se perde com o corte produzido pela Cas9, mas se a célula recebe outra sequência de DNA de interesse, ela é capaz de integrá-la ao seu genoma, preenchendo a lacuna.

Utilidade na medicina de CRISPR

Segundo portais profissionais, como a Clínica Bayer, existem mais de 230 doenças que são causa direta de uma anormalidade genética. Graças a estudos de mapeamento genético, como o famoso projeto do genoma humano, em muitos casos são conhecidas as sequências exatas de DNA que causam essas patologias.

Do ponto de vista teórico —e cada vez mais prático—, a tecnologia CRISPR/Cas9 pode ser usada para regular a expressão gênica. Isso significa que, uma vez identificados os genes defeituosos, pode-se trabalhar para corrigi-los e substituir suas sequências não funcionais por outras válidas.

Não estamos nos movendo apenas em terreno especulativo, porque em 2014 o Massachusetts Institute of Technology (MIT) conseguiu curar um rato de laboratório de uma doença hepática de origem genética com esta tecnologia. Claro, estamos diante de uma verdadeira revolução, tanto médica quanto biológica.

Nem tudo o que reluz é ouro

Método CRIPR/Cas para engenharia genética.
A genética tem um campo promissor pela frente, mas também há restrições éticas e morais que devem ser consideradas.

Apesar de todos os benefícios relatados nas linhas anteriores, não podemos ignorar certos problemas que o sistema CRISPR/Cas apresenta. Mostramos-lhe alguns deles:

  • A especificidade do RNA guia nem sempre é completa: o RNA que guia a Cas9 até o local de corte do DNA celular pode se enganar e hibridizar com uma sequência que não interessa aos pesquisadores. Além disso, é possível que a sequência pesquisada se repita em mais de uma região do genoma.
  • Cas9 pode cortar sem a presença do RNA guia.
  • O jogo das patentes e do monopólio econômico na saúde pública pode trazer alguns problemas.

A situação ética e os direitos humanos

Para além de todos estes interesses, tanto científicos como monetários, não podemos ignorar os problemas éticos que tudo isto suscita. Vários artigos de revisão divagam sobre as possíveis implicações morais da modificação genética em humanos.

«Qualquer pesquisa, tratamento ou diagnóstico que afete o genoma de uma pessoa só será realizado após uma avaliação rigorosa dos riscos e benefícios associados a essa ação e em conformidade com as normas e os princípios legais no país». Declaração Universal sobre o Genoma e os Direitos Humanos..

Claro que a edição genética para prevenção e tratamento de doenças é, sem dúvida, um aspecto positivo para todos. Ainda assim, deparamo-nos com várias frentes a ter em conta: o que acontece se esta informação de mapeamento genético for utilizada, por exemplo, para realizar um aborto num ser vivo funcional?

Além dessas considerações, há uma série de parâmetros que qualquer terapia de modificação genética deve atender. Estes são os seguintes:

  1. A fase experimental realizada em animais é essencial. Isso deve ter mostrado que o novo gene é capaz de atingir a célula doente e realizar sua função ali.
  2. O novo gene implantado no organismo não deve exercer sua função de forma excessiva.
  3. O novo gene não deve, em hipótese alguma, prejudicar o organismo receptor.

Como podemos ver, essas considerações rígidas são difíceis de quantificar. Esse campo de dúvidas se amplia ainda mais se levarmos em conta que, na maioria das vezes, os estudos ainda estão em fase experimental com animais.

Entre benefícios e considerações do sistema CRISPR

Como podemos ver, a tecnologia CRISPR/Cas significou um antes e um depois no mundo da engenharia genética. Graças a ela, o genoma de um organismo pode ser modificado de forma muito mais simples, barata e confiável do que com o uso de outras ferramentas.

Ainda assim, este tipo de técnica levanta uma série de dúvidas e ressalvas que só serão esclarecidas no futuro. Até que ponto a edição de genes é justificada? Quais são os limites? Claro, deixamos essas considerações para continuar debatendo sobre elas.




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