Ácido valpróico: o que é e para que serve?

O ácido valpróico é utilizado para vários distúrbios neuropsiquiátricos, tanto em crianças como em adultos. É um medicamento seguro, mas certas contraindicações absolutas devem ser tidas em conta.
Ácido valpróico: o que é e para que serve?
Diego Pereira

Escrito e verificado por el médico Diego Pereira.

Última atualização: 18 abril, 2023

O ácido valpróico atua como anticonvulsivante e estabilizador do humor em algumas condições psiquiátricas. O seu consumo regular não está associado a muitos efeitos adversos, apesar de existirem várias contraindicações absolutas.

A sua estrutura química é diferente da dos restantes medicamentos para a epilepsia, uma vez que é formada a partir de um ácido graxo. Suas propriedades foram descobertas acidentalmente há várias décadas, tornando-se uma das drogas mais estudadas de seu tipo.

O que é ácido valpróico?

Também chamado de valproato, é um dos anticonvulsivantes mais indicados atualmente. Em parte porque possui vários mecanismos de ação para prevenir e diminuir a intensidade das convulsões.

Além disso, sua atividade como estabilizador do humor também foi avaliada em algumas condições psiquiátricas. Pode ser usado em crianças e adultos, embora a dosagem seja diferente.

Tem a particularidade de ser metabolizado quase inteiramente no fígado. Isso implica que aqueles pacientes que apresentam algum tipo de condição prévia (como cirrose hepática, hepatite ativa e câncer de fígado) devem ser cautelosos.

É considerada uma das drogas mais utilizadas como monoterapia no tratamento da epilepsia. Isso significa que geralmente é prescrito isoladamente. No entanto, nos casos em que é necessário combiná-lo com outro medicamento, várias interações podem ocorrer.

Quando administrado por qualquer via (oral ou intravenosa), o ácido valpróico liga-se a uma proteína plasmática chamada albumina, o que favorece seu transporte para o tecido nervoso. Isso pode ser devido à estrutura química do valproato, que é muito semelhante aos ácidos graxos.

Ácido valpróico para epilepsia.
O valproato tem sua primeira indicação na epilepsia e é um dos medicamentos mais prescritos para esta patologia.

Mecanismo de ação

Como outras drogas neurotrópicas, o ácido valpróico é capaz de modular a atividade elétrica dos neurônios. Vários mecanismos estão envolvidos nisso, mas o mais impressionante é a regulação dos níveis de ácido gama-aminobutírico (GABA) nos neurônios.

Esta é a principal substância inibitória do sistema nervoso central. Sabe-se que, quando o GABA interage com seus receptores em um neurônio, ele induz a abertura de alguns canais que permitem a passagem de pequenos átomos eletricamente carregados. Assim, quando o GABA inibe os neurônios, ocorre um fenômeno eletroquímico conhecido como hiperpolarização.

Nesse caso, os íons cloreto entram na célula, enquanto os íons potássio saem. Tudo isso ocorre em frações muito pequenas de segundo, causando uma reação em cadeia devido às extensas conexões neurais. As concentrações de GABA aumentam devido à estimulação de uma enzima chamada ácido glutâmico descarboxilase.

Também é possível que a droga interaja com a membrana dos neurônios e diminua a capacidade de ser excitada. Se isso acontecer, os focos que geram crises epilépticas poderiam ser neutralizados ou, pelo menos, diminuídos de intensidade.

Indicações para o ácido valpróico

A droga é limitada ao tratamento de algumas condições neuropsiquiátricas, especialmente epilepsia e transtorno bipolar.

Crise de ausência

Este é um tipo de convulsão muito comum na infância, embora possa acontecer em adultos. Neste último grupo, o diagnóstico pode representar um verdadeiro desafio para os especialistas.

Vale ressaltar que, do ponto de vista clínico, os pacientes não costumam apresentar movimentos bruscos e descontrolados. Na verdade, na maioria dos casos, eles podem passar despercebidos. É considerada uma crise epiléptica sem evidência de convulsões comuns.

Os pacientes afetados geralmente estão realizando uma atividade diária quando os sintomas começam. Nesse momento, eles entram em um estado de absorção ou desconexão com o ambiente, no qual perdem a consciência por alguns segundos.

As crises de ausência típicas podem ser acompanhadas por movimentos clônicos de pequenos músculos, como os que envolvem as pálpebras. Às vezes ocorrem automatismos, que são movimentos repetitivos sem propósito aparente.

Convulsões parciais e tônico-clônicas

Esses tipos de convulsões são mais reconhecíveis do que as de ausência. A principal diferença entre convulsões parciais e tônico-clônicas é que a primeira não inclui perda de consciência.

As crises parciais tendem a envolver uma parte específica do corpo e, dependendo da causa, se espalham para outras regiões antes de pararem. Elas não duram muito.

No caso das tônico-clônicas, nunca passam despercebidas. Como o próprio nome indica, são eventos com duas fases bem definidas. A primeira inclui uma espécie de estado de rigidez muscular que pode ser acompanhada por alterações na cor da pele e na frequência cardíaca ou respiratória. Após um curto período de tempo, os pacientes afetados começam a exibir movimentos súbitos, descontrolados e involuntários de todas as extremidades.

Quando as crises se repetem sem recuperação da consciência entre elas ou quando ocorrem por um longo período, desenvolve-se um quadro clínico denominado estado convulsivo. Tem um prognóstico pior e requer um tratamento diferenciado. O ácido valpróico intravenoso, de acordo com algumas revisões, é um medicamento adequado.

Transtorno bipolar

É uma condição psiquiátrica caracterizada por transtornos de humor que flutuam durante um período prolongado de tempo. Os pacientes frequentemente alternam entre períodos depressivos e maníacos entre meses ou anos.

Devido à persistência da doença, o difícil diagnóstico, pois costuma acometer pacientes jovens ou adultos, tende a diminuir muito a qualidade de vida. Existem dois tipos principais da doença (transtorno tipo I e II), embora outras entidades conhecidas como ciclotimia e transtorno bipolar inespecífico também possam ser incluídas.

O arsenal terapêutico para esta condição inclui estabilizadores de humor, anticonvulsivantes, antipsicóticos, antidepressivos, entre outros. Além do lítio, que é a droga mais conhecida nessa área, o ácido valpróico também é bastante eficaz.

Seus efeitos positivos podem estar relacionados à diminuição da dopamina no tecido cerebral, mecanismo diferente daquele que explica sua ação anticonvulsivante. Geralmente é indicado em pacientes que apresentam mudanças rápidas de humor e história de abuso de substâncias.

Contraindicações e efeitos adversos do valproato

O uso regular de valproato não é recomendado nas seguintes condições:

  • Hepatite aguda ou crônica.
  • Insuficiência hepática.
  • Alergia ao ácido valpróico ou a qualquer um dos excipientes.

A maioria dessas contraindicações se deve ao fato de a droga ser metabolizada no fígado. Isso implicaria em sobrecarga de trabalho para um órgão já lesado, o que poderia desencadear consequências negativas.

Os efeitos colaterais desta droga são muito variados, embora não sejam graves. Alguns deles são os seguintes:

  • Distúrbios hematológicos: anemia e trombocitopenia.
  • Aumento de peso.
  • Queda de cabelo: também conhecida como alopecia.
  • Problemas para alcançar a concentração.

Interações do ácido valpróico

A lista de medicamentos com os quais o ácido valpróico pode interagir é longa. Embora seja geralmente indicada como monoterapia em pacientes epilépticos, é provável que eles também tenham comorbidades. De qualquer forma, o médico avaliará a relação risco/benefício e as doses adequadas para cada caso.

Algumas dessas drogas com interação são as seguintes:

  • Antidepressivos.
  • Benzodiazepínicos, como alprazolam.
  • Outros anticonvulsivantes, como carbamazepina, fenobarbital, lamotrigina e fenitoína.
  • Ácido acetilsalicílico (aspirina).
  • Rifampicina.
  • Topiramato, também usado como estabilizador do humor.
O médico mostra um fígado que interage com o valproato.
Pacientes com problemas hepáticos devem consumir valproato com cautela e com monitoramento de seus parâmetros.

Pode ser administrado durante a gravidez e lactação?

O ácido valpróico é uma droga teratogênica, ou seja, capaz de induzir malformações fetais. Alguns autores o consideram o mais perigoso durante a gravidez, por isso não costuma ser usado como tratamento para mulheres em idade fértil.

Algumas das malformações que podem aparecer são espinha bífida e craniossinostose. A primeira caracteriza-se por um defeito na formação da medula espinhal e da coluna vertebral, que apesar de ser mais ou menos frequente, requer tratamento cirúrgico.

Por outro lado, a craniossinostose é um grupo de defeitos em que um dos espaços que unem os ossos do crânio de bebês se fecha prematuramente. Isso leva a deformidades óbvias que podem exigir correção cirúrgica.

Em mães que consomem altas doses desse medicamento, pode ocorrer um conjunto de malformações faciais conhecidas como síndrome do valproato fetal. Nariz achatado, estrabismo e lábio superior pequeno são algumas de suas características.

Ácido valpróico apenas com receita médica

O valproato é um medicamento amplamente utilizado em todo o mundo, mas só deve ser tomado sob indicação médica. As síndromes epilépticas e algumas doenças psiquiátricas como o transtorno bipolar são algumas das condições em que seu uso se justifica.

Devido ao seu alto potencial teratogênico, deve ser evitado em mulheres em idade fértil e sexualmente ativas, a menos que tenham um método contraceptivo. O médico especialista que geralmente prescreve este medicamento é o neurologista ou psiquiatra, conforme o caso.



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