Neuralgia do trigêmeo

A neuralgia do trigêmeo é uma doença insidiosa. Ela afeta um nervo craniano e, como qualquer neuropatia, tende a gerar sintomas ao longo do trajeto ocupado pelo nervo afetado. Vamos dar uma olhada mais de perto nessa patologia, sua forma de apresentação e abordagens terapêuticas.
Neuralgia do trigêmeo
Leonardo Biolatto

Escrito e verificado por el médico Leonardo Biolatto.

Última atualização: 10 maio, 2023

A neuralgia do trigêmeo é uma condição crônica que constitui a dor que se destaca como uma doença em si. Embora as causas não sejam únicas, seu estudo e tratamento dependem da identificação correta da condição como tal.

O sinal por excelência é a dor, que aparece esporadicamente e se espalha por toda a área de inervação do nervo em questão, que é o nervo trigêmeo, que se encontra em ambos os lados do rosto. Estima-se que a prevalência da patologia esteja em torno do acometimento de uma pessoa para cada 10 habitantes, aproximadamente.

A dor dessa neuropatia se intensifica quando ocorrem gatilhos, ou seja, situações capazes de desencadear o desconforto com maior potência. Como sua localização é facial, tocar na bochecha pode ser suficiente para isso. A partir desse momento, são desencadeadas sensações semelhantes a queimação ou choque elétrico.

O que é o trigêmeo?

O nervo trigêmeo, local onde a neuralgia se instala, é uma estrutura dos nervos cranianos. Trata-se de um conjunto de 12 formações neurais que nascem no crânio e cumprem diferentes funções. O quinto par é aquele de que estamos falando, que não se limita apenas a um ramo, mas se ramifica em 3.

Entre as múltiplas inervações que engloba, possui ações sensoriais e motoras. Isso significa que o mesmo par é capaz de levar informações ao cérebro, mas também transferir certas ordens do sistema nervoso central para os tecidos. Em sua asa sensível, ele coleta dados da pele do rosto e das membranas mucosas do rosto. Por outro lado, como nervo motor, estimula os músculos da mastigação.

Ramos do nervo trigêmeo

Um dos três ramos é oftálmico. Este é sensível em sua totalidade e leva informações do couro cabeludo, dos seios paranasais, da córnea e das asas do nariz. O segundo ramo é a maxila, que também é sensitiva e coleta dados das pálpebras, seios paranasais, cavidade nasal, bochechas, lábio superior e maxila, além da mucosa bucal.

Finalmente, o terceiro ramo do nervo trigêmeo é o mandibular. Neste caso, o sensitivo é combinado com o motor. Transmite informações da orelha, da mucosa bucal, da língua, dos dentes, do lábio inferior e das bochechas, ao mesmo tempo em que regula o movimento de alguns músculos mastigatórios, assim como outros presentes na orelha interna.

Essa distribuição anatômica denota os locais onde a dor pode estar presente quando há neuralgia. Embora possa ser mais frequente na região da bochecha, os pacientes costumam perceber o estímulo que se instala no ramo oftálmico como mais doloroso, pois envolve o globo ocular.

Dor de ouvido no homem.
A dor evolui em ataques agudos durante a neuralgia do trigêmeo, com estágios intermediários de latência.

Sintomas da neuralgia do trigêmeo

Obviamente, o sintoma mais poderoso e perceptível da neuralgia do trigêmeo é a dor. Os afetados a descrevem de maneiras diferentes, mas há muita coincidência em se referir a ela como queimação ou eletricidade que percorre o rosto. A queimação é como se o interior do rosto estivesse pegando fogo. A eletricidade, por sua vez, simula pequenas descargas mais ou menos intensas durante o dia ou ao longo das semanas.

Como bem antecipamos, a dor torna-se mais presente diante das ações desencadeadoras. Elas não são a causa da neuropatia, mas estão relacionados aos sintomas, pois aumentam a queimação e a eletricidade ou a iniciam do nada. Entre as situações que mais frequentemente atuam como gatilhos temos as seguintes:

  • Depilação.
  • Esfregar em outra parte do corpo, como a mão.
  • Lavar o rosto.
  • Frio do ambiente, de um ventilador ou ar condicionado, seja de casa ou do carro.
  • Escovação de dentes.
  • Mastigar.

Nenhuma dessas ações deve ser feita violentamente para desencadear a dor. Pelo contrário, a sensibilidade é tão aumentada que um leve toque é suficiente para iniciar o ciclo de neuralgia ou agravar um desconforto já presente.

Duração dos episódios

A duração dos episódios é altamente variável. Enquanto há pacientes que sofrem por alguns minutos ou horas e depois passam por longos períodos de latência, também há outros que sofrem por meses ou mesmo anos de uma sensação de queimação que não para e não acalma com analgésicos ou medidas higiênicas.

Independentemente da duração do ciclo, sempre há momentos de remissão. Isso significa que haverá tempos sem desconforto. De qualquer forma, é lógico esperar um aumento dos episódios com o passar do tempo e o envelhecimento. Ainda não está claro por que evolui para pior, mas é um fato baseado na experiência dos pacientes.

Quais são as causas da neuralgia do trigêmeo?

Ações de gatilho são apenas isso: gatilhos de dor. Mas as causas ou etiologia são coisas diferentes no caso da neuralgia do trigêmeo. Embora se saiba que o nervo do quinto nervo craniano é o protagonista, não há clareza sobre os mecanismos que levam à neuropatia já estabelecida.

Nas situações mais benignas, pode ser atribuída a um vaso sanguíneo que pressiona o nervo, seja por uma má posição anatômica ou por um alargamento da artéria ou veia que leva ao aperto. Isso pode ser entendido como um pequeno aneurisma na área do crânio por onde passa o trigêmeo.

Outra opção etiológica seria a perda de mielina do nervo craniano. Esta condição é comum e faz parte da evolução de patologias como a esclerose múltipla, mas a possibilidade de desmielinização deste nervo particular em segmentos específicos em pacientes está sendo considerada. A mielina é a bainha gordurosa que permite a transmissão rápida do impulso nervoso; sua perda altera essa comunicação gerando sintomas.

Traumas que atingem o trigêmeo e o danificam explicariam o aparecimento de dores em pessoas que passam a sofrê-las após uma intervenção odontológica ou um acidente de trânsito, por exemplo. Também não é incomum naqueles que se submetem a cirurgias cranianas, nasais ou orais.

Por fim, vale destacar os tumores, não necessariamente malignos. Os tumores que invadem a via trigeminal causam dor pelo mesmo mecanismo dos vasos sanguíneos que pressionam os neurônios.

Tratamento do distúrbio

O tratamento da neuralgia do trigêmeo pode ser feito com medicamentos, mas nem sempre o resultado é eficaz ou surte os efeitos desejados. A condição crônica do transtorno e sua evolução em exacerbações que aumentam dificultam sua abordagem a médio e longo prazo.

Analgésicos e anti-inflamatórios são a primeira escolha. Entre eles há uma gama de opções que vão desde esteroides e não esteroides até morfínicos. Estes podem ser combinados com outros que tenham ações complementares de alívio, como os relaxantes musculares.

Um caso especial são os antidepressivos usados para dor neuropática. Talvez os mais estudados sejam os tricíclicos, também prescritos nos protocolos de neuralgia herpética, por exemplo.

Esgotadas as instâncias não intervencionistas, o próximo passo é o cirúrgico. Várias opções foram tentadas e ainda são utilizadas na prática clínica para tentar trazer alívio aos pacientes. Analisamos os mais usados.

Radiocirurgia

Consiste na irradiação do nervo por meio de um aparelho projetado para esse fim. Primeiro, são feitas imagens para planejar a incidência dos raios e, em seguida, são agendadas sessões nas quais a zona trigeminal é afetada, principalmente em sua origem cerebral.

Uma variante é a radiocirurgia Gamma Knife. O princípio é semelhante, usando uma espécie de faca que converge feixes de radiação na área a ser tratada.

Frequência de rádio

Na radiofrequência, uma agulha é incisada e direcionada ao trigêmeo. Isso é feito sob anestesia no paciente. Uma vez dentro do corpo, a agulha é capaz de transmitir calor por meio de eletrodos, o que causaria alterações nos neurônios, melhorando os sintomas.

Dor na mandíbula devido à neuralgia do trigêmeo.
A dor na mandíbula neste distúrbio pode ser causado por um procedimento odontológico que desencadeou a neuralgia.

Glicerol

O uso de glicerol é com injeções intracranianas. O profissional insere a agulha na base do crânio e a direciona até a origem do nervo. A substância seria capaz de inibir a transmissão de sinais dolorosos ao se depositar naquela região anatômica, onde reside um minúsculo saco com líquido cefalorraquidiano.

Descompressão vascular

Essa técnica é a mais complexa, mas estudos científicos relatam uma eficácia maior que as demais. É usado quando há uma artéria que está comprimindo o nervo trigêmeo. Com o procedimento, essa compressão é liberada no mesmo local, influenciando e aliviando o aperto. Anestesia, equipe cirúrgica treinada e dias de internação são necessários para a recuperação.

Caso o neurocirurgião não encontre uma artéria no meio do processo, ele pode optar por completar com uma neurectomia. Com ela se trata de remover uma parte do nervo, onde a dor deveria se originar, para que o desconforto desapareça. Como dizemos, é uma segunda tentativa.

A difícil abordagem da neuralgia do trigêmeo

Viver com neuralgia do trigêmeo é difícil, mas não só para o paciente. A família e os próximos devem se ajustar a uma pessoa com dor crônica. Da mesma forma, os profissionais envolvidos enfrentam um problema que põe à prova suas capacidades diagnósticas e terapêuticas.

Todas as abordagens terapêuticas têm suas deficiências. Às vezes pode funcionar e outras vezes não. O fato de preferir a radioterapia ou tentar soluções com medicamentos orais dependerá de cada situação clínica particular.



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