Dermatofagia: o que é e como tratar
O hábito de morder a borda da pele que cobre as unhas ou a pele fina da parte interna das bochechas é relativamente comum. As pessoas fazem isso quando estão ansiosas, tensas ou entediadas. Se o comportamento for repetitivo e causar repercussões físicas, é provável que você esteja enfrentando um caso de dermatofagia. Ou seja, um distúrbio bem definido que leva o hábito a contextos patológicos.
Este distúrbio foi conhecido em muitas formas no passado. Durante décadas, foi referido como wolf-biting, e só recentemente ganhou interesse no mundo médico. Ainda não se sabe muito sobre isso, mas acredita-se que seja um tipo de transtorno obsessivo-compulsivo (TOC) relacionado ao comportamento repetitivo focado no corpo (BFRB).
Sintomas de dermatofagia
O distúrbio é caracterizado por uma compulsão de morder ou roer uma parte do corpo. É feito consciente ou inconscientemente, e vai além de um hábito repetitivo que se faz ocasionalmente. De fato, um paciente com o distúrbio rói, morde ou mastiga a superfície da pele de forma recorrente; tanto que com o passar das semanas ou meses, começa a sofrer. Vejamos alguns de seus principais sintomas:
- Morder ou roer a superfície da pele, especialmente nas mãos e dentro da boca.
- Pele vermelha, desgastada ou com calos.
- Sangramento na área afetada.
- Cicatriz ou descoloração na superfície da pele.
- Angústia e sentimentos de compulsão.
Como a pele fica exposta ao longo do tempo, as pessoas geralmente desenvolvem processos infecciosos. A área afetada pode ficar infectada, por isso vai inchar e exsudar pus. Como consequência, também podem aparecer sintomas como febre, dor de cabeça e mal-estar geral. Embora a pessoa roa a pele, geralmente não ingere os restos.
Como as pessoas com esse hábito não o fazem para comer a pele, muitos pesquisadores propõem o termo dermatodaxia. Isso porque dermatofagia vem do grego derma (‘pele’) e phago (‘comer’). Por sua vez, a dermatodaxia é composta por derma (‘pele’) e daxia (‘mordida’). No entanto, os profissionais de saúde e o público em geral costumam se referir a esse hábito como dermatofagia.
Os sintomas pioram em situações estressantes, em determinados contextos ou locais e de acordo com os níveis de ansiedade. Mesmo assim, nem sempre a pessoa tem consciência do que está fazendo; e são seus amigos ou familiares que o alertam sobre seu hábito compulsivo.
Não é incomum que a pessoa afetada desenvolva vergonha por seu comportamento, de modo que opte por se isolar. Isso, por sua vez, pode levar à depressão.
Causas da dermatofagia
Conforme apontam os pesquisadores, esse hábito se resume a um comportamento repetitivo, de forma que pode ser classificado como um transtorno obsessivo-compulsivo (TOC). Muitas vezes, as pessoas manifestam outros distúrbios relacionados, como tricotilomania (hábito de puxar o cabelo), dermatilomania (hábito de beliscar a pele) e onicofagia (hábito de roer unhas).
Da mesma forma, o distúrbio é considerado um tipo de comportamento repetitivo focado no corpo (BFRB). Ou seja, o hábito compulsivo de causar lesões físicas ou ir contra a própria integridade corporal. As causas exatas do BFRB não são conhecidas, mas alguns especialistas sugerem que os déficits na regulação emocional podem explicar muitos casos.
BFRB é mais comum do que se pensava, pois estima-se que pode afetar até 12% da população mundial.
Foi encontrada uma relação entre BFRB e histórico familiar, de modo que alguém que tenha um parente de primeiro grau com esse distúrbio tem maior probabilidade de desenvolvê-lo no futuro. Traumas e ansiedade durante a infância e juventude também estão entre seus possíveis gatilhos.
Embora muitos o considerem um tipo de TOC, nem todos os pacientes com esse distúrbio desenvolvem dermatofagia. O interesse por parte da comunidade médica é recente, pelo que os seus catalisadores e relações com outras patologias (ou se merece uma classificação individual) não são totalmente compreendidos. Geralmente começa no final da infância e início da adolescência.
Diagnóstico de dermatofagia
A dermatofagia não está incluída na quinta edição do Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais (DSM-5), portanto não há critérios formais para diagnosticá-la. Apesar disso, um profissional de saúde com base nos sintomas, na entrevista com o paciente e no histórico médico pode fazer um diagnóstico preciso do distúrbio.
O principal critério para o diagnóstico de dermatofagia é o sofrimento patológico. Certamente, e como já mencionamos, não é um simples hábito ocasional. O comportamento causa angústia e frustração nos afetados e é acompanhado por uma alteração para levar uma vida normativa ou social. A presença de estresse e ansiedade são, portanto, outros indicadores que são levados em consideração durante o diagnóstico.
Opções de tratamento
Não existe um tratamento padrão para lidar com o transtorno, embora possa ser controlado com base em psicoterapia e ingestão de medicamentos (estes últimos em casos moderados ou graves). A terapia cognitivo-comportamental costuma ser a mais eficaz, pois ensina o paciente a controlar seus pensamentos e comportamentos para reduzi-los.
Quanto aos medicamentos, e se o profissional sugerir, podem ser prescritos inibidores seletivos da recaptação da serotonina. Estes são o grupo de antidepressivos mais amplamente utilizado, em parte porque são mais seguros e têm menos efeitos colaterais. Ansiolíticos e outros medicamentos relevantes também podem ser prescritos.
O especialista também irá sugerir mudanças no estilo de vida. Evitar situações estressantes, reduzir o consumo de café, tabaco e álcool, praticar exercícios, manter uma alimentação balanceada, ter vida social e praticar atividades relaxantes (yoga, meditação e outras) podem fazer uma diferença notável. Os danos na pele serão tratados localmente para facilitar a cicatrização.
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