O diabetes pode causar diarreia?
O diabetes mellitus é uma patologia endocrinometabólica caracterizada pela presença de níveis elevados de glicose no sangue. Ele apresenta uma grande variedade de complicações e efeitos colaterais que afetam múltiplos órgãos, sendo o gastrointestinal um dos mais esquecidos. Você quer saber se o diabetes pode causar diarreia? Continue lendo!
O diabetes pode gerar o aparecimento de diarreia crônica; na verdade, ela é conhecida sob o nome de diarreia diabética há mais de 70 anos. Vários estudos mostram a prevalência desse sintoma no diabetes e estabelecem que ele está presente entre 8 e 22% dos pacientes.
Em geral, a diarreia em pessoas diabéticas costuma ser grave e não dolorosa, com fezes abundantes, de cor marrom, consistência aquosa e com ocorrência predominantemente noturna. Pode ser acompanhada por esteatorreia, ou seja, formações gordurosas nas fezes.
Essa complicação está relacionada aos níveis de açúcar no sangue, sendo mais frequente em pessoas sem um controle glicêmico adequado.
O que pode causar diarreia no diabetes?
Em termos gerais, a diarreia nada mais é do que a evacuação de fezes com mais frequência do que o habitual e com diminuição na consistência. São múltiplas as circunstâncias que podem explicar o aparecimento da diarreia em pessoas com diabetes, entre as quais se destacam:
Neuropatia diabética
A neuropatia diabética é uma complicação frequente da doença, que surge devido a lesões nervosas causadas pela hiperglicemia constante. Uma das formas de apresentação mais comuns é a neuropatia periférica, na qual há lesão dos nervos das extremidades, principalmente das pernas.
No entanto, existe um tipo de neuropatia diabética chamada neuropatia autonômica, que afeta a todos os nervos pertencentes ao sistema nervoso autônomo (SNA) do corpo. O SNA é responsável por controlar várias funções involuntárias, incluindo o movimento gastrointestinal.
Alguns estudos estabelecem que a doença gastrointestinal na neuropatia autonômica se deve à redução do número de neurônios e à alteração da inervação do décimo par craniano ou nervo vago. Alterações na secreção de neurotransmissores, além de hipoxemia e isquemia intestinal também foram demonstradas.
Todas as alterações acima mencionadas podem causar aumento do peristaltismo, gerando o aparecimento de diarreia no diabetes. Além disso, a neuropatia pode afetar os músculos anorretais, levando à incontinência fecal juntamente com diarreia.
Crescimento excessivo da microbiota intestinal
A microbiota é composta por milhões de bactérias que habitam o trato gastrointestinal e geram uma relação simbiótica, ou seja, de benefício mútuo entre a bactéria e o organismo. Elas auxiliam no metabolismo de macronutrientes como carboidratos e gorduras, bem como na prevenção de infecções e doenças.
Uma multiplicação anormal nas bactérias da microbiota pode levar ao aparecimento de sintomas anormais, incluindo diarreia. Na verdade, estudos mostram que até 80% dos diabéticos com diarreia apresentam crescimento excessivo da microbiota intestinal, o que está relacionado a maior incidência fecal nos pacientes.
O supercrescimento bacteriano pode levar à formação de micelas de gordura, o que explica a presença de esteatorreia. Ele também aumenta o consumo intraluminal de carboidratos e a secreção de agentes inflamatórios que afetam a absorção dos alimentos. Todas essas mudanças juntas geram o aparecimento da diarreia diabética.
Fatores dietéticos
Muitos dos pacientes com diagnóstico de diabetes usam adoçantes artificiais sem açúcar para ter um estilo de vida mais saudável. Esses adoçantes geralmente usam uma substância chamada sorbitol, que pode ser mal absorvida e causar diarreia.
A má absorção do sorbitol está relacionada à quantidade ingerida, portanto, quanto maior o consomo, maior a probabilidade de desenvolver o efeito colateral. Por outro lado, muitos diabéticos também sofrem de doença celíaca, o que os torna intolerantes ao glúten. Nesse sentido, o consumo desse composto causará diarreia.
Efeito colateral de drogas
O consumo de certos medicamentos também pode causar o aparecimento de diarreia em pacientes com diagnóstico de diabetes, como parte dos efeitos colaterais. Um dos medicamentos mais usados no tratamento do diabetes tipo 2 é a metformina, no entanto, ela tem sido associada ao aparecimento de diarreia em muitos casos.
A diarreia como efeito colateral da metformina geralmente aparece quando o tratamento é iniciado; geralmente é leve e desaparece por conta própria após alguns dias. Alguns estudos estabelecem que esse efeito colateral pode surgir devido à liberação de histamina no intestino e ao aumento dos sais biliares, que têm efeito osmótico.
Por outro lado, é importante destacar que a metformina não é o único medicamento utilizado no controle do diabetes que pode gerar esse sintoma. Nesse sentido, outros medicamentos que aumentam a probabilidade de sofrer de diarreia diabética são os seguintes:
- Sulfonilureias.
- Acarbose.
- Análogos de GLP-1.
Fatores de risco para a diarreia diabética
Existem várias condições que podem aumentar o risco de diarreia diabética, apesar de não serem uma causa direta da doença. Esses fatores foram estabelecidos por meio de variáveis epidemiológicas, ou seja, as pessoas nas quais essa complicação é mais frequente.
A maioria dos fatores de risco está relacionada à biologia humana, portanto, não podem ser modificados. Nesse sentido, uma pessoa está mais sujeita a diarreia diabética quando apresenta alguma das seguintes características:
- Ser mulher.
- Ter mais de 50 anos.
- Sofrer de diabetes de qualquer tipo há mais de 8 anos.
- Ter diabetes tipo 1 mal controlada.
- Fazer uso de insulina exógena por muitos anos.
Tratamento da diarreia diabética
O tratamento da diarreia no diabetes é sintomático, por isso é baseado na reposição adequada de fluidos e diminuição do trânsito intestinal. Nesse sentido, o especialista poderia indicar o uso de medicamentos antidiarreicos ou antiespasmódicos, a fim de diminuir a frequência das evacuações.
Por sua vez, essa condição é mais frequente em quem não tem um controle glicêmico adequado, por isso uma das principais medidas é manter os níveis glicêmicos normais. Também pode ser necessário eliminar da dieta todos os alimentos que causam diarreia em pacientes com diabetes.
Quando a condição é produto do efeito colateral de um medicamento, o médico deve ser consultado imediatamente. Nesses casos, a condição pode se resolver sozinha após alguns dias. Porém, se a diarreia piorar, será necessário buscar uma alternativa de tratamento.
Prevenção
Infelizmente, não existem medidas 100% eficazes para prevenir a diarreia diabética; no entanto, as pessoas podem tomar medidas para reduzir o risco de desenvolvê-la. Uma das principais recomendações é o monitoramento constante dos níveis de glicose, para mantê-los na quantidade ideal ao longo do tempo.
Manter a glicose no sangue em níveis ideais também diminui a probabilidade de desenvolver neuropatia diabética, evitando assim uma ampla variedade de complicações adicionais. Por sua vez, também é recomendável limitar a ingestão de adoçantes artificiais que contenham sorbitol, bem como de outros alimentos que causam diarreia.
O consumo de novos hipoglicemiantes deve ser feito em doses moderadas, visto que o desenvolvimento de diarreia como efeito colateral aumenta com doses altas. No entanto, é sempre aconselhável consultar um especialista antes de tomar qualquer medida em relação ao estilo de vida ou aos medicamentos.
Diarréia no diabetes: uma complicação comum
O diabetes mellitus é uma doença crônica que pode causar o aparecimento de uma ampla variedade de sintomas, incluindo diarreia. Esta complicação é mais comum do que se pensa e é conhecida há muitos anos. O tratamento dessa condição dependerá da sua causa exata, embora antiespasmódicos e antidiarréicos quase sempre possam ser usados.
Viver com diarreia pode ser muito desconfortável para as pessoas, especialmente quando ela está associada à incontinência fecal. No entanto, esse impacto sempre pode ser reduzido com ajuda médica especializada.
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