Transtorno dismórfico corporal: o que é?
Todos nós temos algum aspecto do nosso físico que gostaríamos que fosse diferente. A acne, o tamanho dos seios, uma cicatriz, a altura, o tamanho do nariz ou o formato das orelhas costumam ser elementos que gostaríamos de ter mudado em algum momento de nossas vidas. Nesse sentido, as pessoas que sofrem de transtorno dismórfico corporal levam sua preocupação a um nível totalmente desadaptativo e isso pode gerar sérios problemas no seu dia a dia.
Embora o defeito possa não ser perceptível para os outros, aqueles com transtorno dismórfico corporal tendem a ampliá-lo. Suas preocupações podem até atingir um nível que pode ser descrito como delirante. Elas podem passar até 8 horas por dia concentrando-se no conteúdo de suas preocupações relacionadas à sua aparência física em particular.
A preocupação dismórfica é caracterizada por ser insidiosa, repetitiva e muito difícil de resistir e controlar.
– Amparo Belloch –
O que é transtorno dismórfico corporal?
Para a Associação Americana de Psiquiatria (APA), em sua quinta versão do Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais (DSM-5), o transtorno dismórfico corporal (TDC) é caracterizado pela “preocupação com um ou mais defeitos percebidos em um aspecto da aparência que não é observada ou parece leve para os outros“.
Além disso, as pessoas com transtorno dismórfico corporal devem se envolver em comportamentos repetitivos (rituais) em resposta às suas preocupações. Por esta razão, esta entidade clínica está incluída no capítulo «Transtorno Obsessivo-Compulsivo (TOC) e afins».
Apesar de compartilhar características, difere do TOC porque no transtorno dismórfico corporal as obsessões e compulsões estão circunscritas a um defeito físico real ou imaginário, enquanto no TOC são mais gerais e menos limitadas.
Verificou-se que é um distúrbio mais prevalente em mulheres, com exceção de ambientes relacionados a cosméticos, onde paradoxalmente são os homens que apresentam índices mais elevados.
– Amparo Belloch –
Características comuns de TDC e TOC
Ambas as entidades clínicas são semelhantes quanto à presença de obsessões e compulsões.
O que é uma obsessão?
Para a Organização Mundial da Saúde (OMS), as obsessões ocorrem na forma de pensamentos repetidos, recorrentes e persistentes. Elas também podem assumir a forma de imagens e até mesmo de impulsos. Elas são irritantes, indesejadas e causam ansiedade.
O que é uma compulsão?
Diante do aparecimento de obsessões, as pessoas com transtorno dismórfico corporal e TOC tentam lidar com elas de maneiras diferentes. Elas podem tentar ignorá-las, evitá-las, silenciá-las ou neutralizá-las. Essas formas de combater as obsessões adotam o nome de compulsão.
Portanto, as compulsões consistem em comportamentos também repetidos (podem consumir até 8 horas por dia) que os pacientes realizam em resposta às suas obsessões. Em geral são muito rígidos, ou seja, devem seguir um padrão específico: um ritual.
Como resultado, as pessoas com transtorno dismórfico corporal podem se tornar extraordinariamente tímidas em responder a ideias de referência. As ideias de referência podem ser definidas como a certeza que essas pessoas têm de que estão sendo observadas por outras, que estão fazendo julgamentos sobre o defeito físico que as preocupa: “estão falando do meu nariz”, “perceberam que tenho pouco peito”, “ele me olhou mal porque tenho tantas espinhas que estou nojento”.
Atos mentais excessivos e repetitivos executados em resposta à preocupação dismórfica incluem verificação, comparação, limpeza excessiva e cutucar a pele.
– Amparo Belloch –
Que comportamentos as pessoas com transtorno dismórfico corporal realizam?
Para a professora de psicopatologia Amparo Belloch, os comportamentos dismórficos podem assumir até 7 formas diferentes. Por meio delas, as pessoas com transtorno dismórfico corporal tentam alterar seu defeito para colocá-lo em níveis que consideram aceitáveis. Elas também tentam impedir que o defeito seja visto ou alterar o fato de que outros possam prestar atenção nele.
As pessoas com transtorno dismórfico corporal geralmente se envolvem em um grande número de comportamentos, tanto explícitos quanto ocultos, que consomem muito tempo e esforço.
– Amparo Belloch –
A comparação
Todos nós sabemos que as comparações com outras pessoas podem se tornar importantes fontes de sofrimento. No entanto, em pessoas que sofrem de transtorno dismórfico corporal, esse fato atinge níveis mais elevados. De fato, cerca de 90% dos pacientes comparam a parte ou área que o defeito ocupa que eles percebem como defeituosa com a mesma parte ou área de outras pessoas. Nesse sentido, costumam escolher indivíduos que correspondam ao gênero e à idade.
Muito exercício
Essa é uma estratégia que se revela com mais intensidade nos casos de dismorfia corporal. A dismorfia corporal é um tipo de transtorno dismórfico corporal mais característico do sexo masculino em que a preocupação gira em torno da percepção de que o corpo é muito pequeno ou pouco musculoso.
Assim, para atingir o grau de muscularidade que o paciente pode considerar normal, ele se submete a rotinas de exercícios extenuantes, que podem ser facilmente classificadas como “excessivas” por outros.
O espelho
Espelhos, vidros, superfícies brilhantes e vitrines são fontes de informação para pessoas com transtorno dismórfico corporal. O fato de olhar continuamente para as superfícies reflexivas procurando saber como está o defeito ou se está muito visível, é um fator que pode manter e até agravar o problema.
Os comportamentos de procurar superfícies reflexivas nas quais se ver são muito comuns. Aproximadamente 90% dos pacientes os realizam diariamente, de forma breve ou prolongada. Entre os motivos que os orientam a realizar esses comportamentos, há também a esperança.
Os pacientes acreditam que seu defeito físico é refletido nos espelhos de uma maneira diferente de como eles o visualizam em suas mentes. Além disso, após longos períodos sendo avaliados em superfícies refletoras, outros fenômenos clínicos podem ocorrer, como episódios dissociativos.
Cirurgia contra a imperfeição
O profissional médico mais procurado por essas pessoas é o dermatologista. Do total de pacientes com transtorno dismórfico corporal, até 70% já foram submetidos a diversas intervenções de medicina estética, entre as quais destacam-se as operações estéticas, os tratamentos cosmetológicos e as intervenções dermatológicas.
Além disso, se um profissional médico lhes nega a intervenção por razões de ética médica ou não têm meios financeiros para pagar o tratamento, recorrem à intervenção em casa.
O objetivo que perseguem é claro: a modificação da aparência corporal. Além disso, se o dano autoinfligido for excessivo, eles têm certeza de que os profissionais médicos aceitarão seu caso por motivos de saúde urgentes.
A realização desses procedimentos geralmente não alivia os sintomas, mas aumenta a insatisfação.
– Amparo Belloch –
Ocultação do defeito
Sem meios para alterar o elemento corporal que percebem como excessivamente imperfeito, as pessoas com transtorno dismórfico corporal tentam escondê-lo. Para isso, qualquer método é bom desde que cumpra seu objetivo. Entre os meios mais utilizados estão chapéus, maquiagem, posturas ou roupas.
Coçar a pele
Esse é um comportamento de pacientes com transtorno dismórfico corporal que também ocorre no TOC. Parece que o ato de coçar a pele, ou mesmo cutucá-la, poderia apagar o defeito como se nunca tivesse existido. Na verdade, esse comportamento foi descrito em uma em cada três pessoas com TDC.
O ato de evitar
Quando as estratégias anteriores tiveram pouco efeito e o desconforto persiste, os pacientes com transtorno dismórfico corporal podem optar por se isolar. Nesse sentido, evitar situações que envolvam interação social ou exposição pública é realizado como uma estratégia que tenta mitigar emoções de valência negativa como desconforto ou ansiedade que podem surgir quando se sentem observados.
A evitação pode levar ao confinamento do paciente em sua própria casa por longos períodos de tempo.
– Amparo Belloch –
Existem variantes do transtorno dismórfico corporal?
A maioria das variantes tem a ver com a forma como esta entidade clínica é descrita em diferentes culturas humanas. Nesse sentido podemos citar alguns:
- Dismorfia muscular. Como comentamos, é uma variante que ocorre principalmente no gênero masculino e que tem a ver com a percepção de um corpo pequeno e com poucos músculos.
- Transtorno dismórfico corporal por procuração. Essa variante refere-se à preocupação excessiva com a imperfeição de um defeito físico em outras pessoas (e não em nós mesmos). Apesar de nosso parceiro, nosso familiar ou nosso amigo ter aparência e aparência normais, as pessoas com transtorno dismórfico corporal se preocupam excessivamente com seus defeitos físicos.
- Síndrome de referência olfativa (SRO). Esta variante refere-se à crença e percepção do próprio odor corporal como repulsivo, repugnante e indigno. Além disso, apesar de tentar camuflá-lo, as pessoas com SRO tendem a acreditar que outras pessoas podem sentir seu odor desagradável.
- Taijin Kyofusho. Esta é a versão chinesa do transtorno dismórfico corporal. Ele está mais relacionado à fobia social, pois o Taijin Kyofusho está mais vinculado ao medo de relacionamentos interpessoais. O aspecto chave para o qual é considerado uma variante do transtorno dismórfico corporal é que a ansiedade de relacionamento social ocorre no contexto da aparência física. As pessoas com Taijin Kyofusho temem que sua aparência física possa ofender os outros.
- Jikoshu-kyofu. É a versão japonesa da síndrome de referência olfativa que descrevemos anteriormente.
- Koro. Esta é uma variante curiosa da cultura malaia-indonésia. Na China é chamado de Suoyang e refere-se ao medo de retrair os próprios órgãos genitais, ou seja, encolher o pênis, os lábios, os seios ou os mamilos. Como resultado dessa retratação, as pessoas com essa variante do transtorno dismórfico corporal acreditam que sua genitália pode eventualmente desaparecer.
Entre as possíveis causas desta curiosa entidade clínica, destacou-se o papel que a mídia e as redes sociais podem estar desempenhando. Nesse sentido, as mensagens que transmitem em prol de um ideal de beleza difícil de alcançar podem ter um papel relevante.
A percepção do “eu como objeto estético” também é fundamental e se refere à experimentação de extrema autoconsciência e autofocalização na imagem distorcida.
– Amparo Belloch –
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Belloch, A. (2023). Manual De Psicopatologia. Vol. II (2.a ed.). McGraw-Hill Education.
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