Por que sentimos medo?
Por que sentimos medo? Isso é normal? Quando se torna patológico? Quando falamos de medo, nos referimos a uma emoção universal que permite a sobrevivência. Através dela nos protegemos do que pode nos causar um dano, mesmo que às vezes seja paralisante.
Alguns medos são inatos e instintivos e outros são aprendidos, como veremos ao longo do artigo. Também encontramos os evolutivos, que são um componente do desenvolvimento normal (especialmente durante a infância). Estes últimos são transitórios e não interferem no funcionamento diário.
Neste artigo, tentaremos lançar alguma luz sobre a questão de por que as pessoas sentem medo, até que ponto a genética desempenha um papel aqui e que função ele tem na vida. Por fim, também diferenciaremos o medo das fobias.
“Primeiro você aprende a ter medo e depois essa informação é armazenada no cérebro.”
-José Antonio Portellano-
Por que sentimos medo?
A realidade é que estamos programados para sentir medo. Como em outras espécies, o DNA contém os dados para uma resposta de medo a predadores potenciais e frente a múltiplos estímulos.
Você pode ter medo de qualquer coisa, embora existam alguns mais prevalentes e evolutivos do que outros: são medos relacionados ao perigo. Por exemplo, cobras, fogo, alturas, tubarões. Acredita-se que eles tenham um sentido evolutivo (adaptativo), pois permitiram que nossos ancestrais sobrevivessem.
Segundo José Antonio Portellano Pérez, psicólogo clínico e professor da Universidade Complutense de Madrid, haveria dois tipos diferentes de medo: os medos endógenos (congênitos), não aprendidos, que já estão programados em nossos genes, e os medos adquiridos.
Quanto aos primeiros, são menos frequentes que os eruditos e incluem o medo de fenômenos naturais, como tempestades ou medo da morte.
“O medo da morte é o medo congênito mais antigo que existe na espécie humana.”
-José Antonio Portellano Pérez-
Objetivo: a sobrevivência
Respondendo à pergunta sobre por que sentimos medo, encontramos entre suas primeiras explicações o desejo de sobrevivência do ser humano. Isso tem a ver com os medos evolutivos discutidos.
Em relação a isso, uma equipe de pesquisadores da Universidade de Columbia, em Nova York, estudou quais eram as fobias mais comuns que existiam, sendo elas a fobia de aranhas e cobras. Entre suas conclusões, eles encontraram o seguinte: o medo de aranhas (aracnofobia) surgiu há centenas de milhares de anos, no início da evolução humana na África, um lugar onde as aranhas eram um perigo iminente.
O mesmo estudo revela outro fato interessante: o medo era tão grande nesses estágios iniciais da evolução humana que ficou registrado no DNA. Então, de certa forma, existem medos que são genéticos.
“Ao longo da história dos primatas, as cobras estiveram entre seus predadores mais mortíferos. O que significa que a tendência humana de temê-las pode ser herdada de nossos ancestrais.”
– Nathan H. Lens –
Diferenças entre medo e fobia
Por que sentimos medo? Ter medo é o mesmo que fobia? Não, são dois conceitos diferentes. Embora ter medo seja, até certo ponto, algo normal, o fato de sofrer de uma fobia implica entrar em psicopatologia. O que queremos dizer? Que diferenças encontramos?
Medos são respostas caracterizadas por uma sensação desagradável diante de um estímulo, causada pela percepção de um perigo, real ou suposto, presente, futuro ou mesmo passado. Por outro lado, uma fobia é a presença de um medo intenso de um estímulo específico que não precisa ser perigoso, ao qual a pessoa responde com altos níveis de desconforto, ansiedade ou evitação da situação.
Ou seja, o medo não é patológico porque não interfere na vida do indivíduo nem causa deterioração ou desconforto intenso, enquanto a fobia sim. Assim, enquanto o medo teria um sentido evolutivo de sobrevivência, a fobia não.
Por que a fobia é patológica?
Ao contrário do que acontece com o medo, as seguintes características se reúnem em uma fobia:
- A reação é desproporcional ao perigo da situação. No medo, a reação geralmente é ajustada ao perigo do estímulo.
- É irracional, resistente a explicações e raciocínios. O medo pode ser melhor administrado, embora as fobias sejam difíceis de controlar.
- Situações temidas são evitadas. Com medo também acontece isso, embora por razões diferentes.
- Não são transitórias e não desaparecem espontaneamente, como é o caso dos medos.
- Interferem na vida da pessoa. Os medos não, ou se o fazem, não é de forma significativa.
O porquê do medo
Como vimos, o medo é uma reação normal do indivíduo a situações perigosas. Embora seja verdade que existem pessoas que podem desenvolver medo de estímulos não perigosos (falar em público, interagir com outras pessoas), isso ocorre com aqueles que são mais apreensivos.
Assim, inseguranças e baixa autoestima também explicariam em parte o surgimento de certos medos, principalmente aqueles direcionados a estímulos que a priori não são perigosos. Um exemplo disso seriam os medos de natureza social, que se intensificados levam à fobia social.
Medos aprendidos
Viver uma experiência traumática também aumenta a probabilidade de desenvolver um medo ou fobia. Se um cachorro nos morder e desenvolvermos uma fobia deles, por exemplo. As possibilidades são infinitas.
Nestes casos falamos de medos aprendidos. Segundo o psicólogo José Antonio Portellano, a grande maioria dos medos que sentimos são condicionados. Primeiro há um aprendizado de ter esse medo e depois a informação fica armazenada no cérebro.
Onde o medo é aprendido ou registrado? Na amígdala, estrutura cerebral que constitui o centro de condicionamento, no qual se mantém o significado emocional dos sinais sensoriais.
Você pode perder o medo?
A resposta é sim você pode. Existem várias razões que explicariam como e por que perdemos certos medos. Os evolutivos típicos da infância (medo do escuro, de ficar sozinho, de pessoas estranhas) desaparecem por conta própria com o tempo. Ou seja, eles desaparecem dentro de uma determinada faixa etária.
Existem outros medos que também são perdidos trabalhando neles (na terapia, nos expondo à situação). Finalmente, a um nível mais biológico, existe uma curiosa síndrome, a de Kluver-Bucy, que envolve uma lesão nas amígdalas do cérebro e que gera uma insensibilidade geral aos estímulos geradores de medo.
Todos nós sentimos medo
“Não é a morte que um homem deve temer, mas ele deve temer nunca começar a viver”.
-Marco Aurélio-
É praticamente impossível não ter medo. Todas as pessoas têm medo em maior ou menor grau e dependendo dos estímulos. Qualquer ambiente sociocultural pode facilitar, em algum momento, o sentimento de medo de determinados estímulos.
Ter medo não é patológico, mas algo evolutivo. Sempre faz sentido, mas às vezes temos que agir para descobrir o que ele está tentando nos dizer.
Em geral, a melhor solução para superá-lo será enfrentar a situação que estamos tentando evitar. O medo deve nos servir para evoluir e aprender, bem como para tomar consciência de nossas inseguranças, para não retroceder ou evitar viver de verdade.
- American Psychiatric Association -APA- (2014). DSM-5. Manual diagnóstico y estadístico de los trastornos mentales. Madrid. Panamericana.
- Belloch, A., Sandín, B. y Ramos, F. (2010). Manual de Psicopatología. Volumen II. Madrid: McGraw-Hill.
- Caballo, V. y Simón, M. A. (2002). Manual de Psicopatología Clínica Infantil y del adolescente. Trastornos generales. Pirámide: Madrid.
- Lanska, Douglas J. “The Klüver-Bucy syndrome.” Neurologic-Psychiatric Syndromes in Focus-Part I. Vol. 41. Karger Publishers, 2018. 77-89.
- Lents, N. (2016). Not So Different: Finding Human Nature in Animals. Columbia University Press.
- Öhman, A. (2000). “El miedo y la ansiedad: evolutiva, cognitiva y perspectivas clínicas”. En Lewis, Michael; Haviland-Jones, Jeannette M. Manual de emociones . Nueva York: The Guilford Press. pp. 573-93.
- Portellano, J.A. (2010). Neuropsicología: presente y futuro. Polibea, 94: 30-36.
- de la Sierra, Regina Cejudo, and Alexis Fernández Mesa. “Fobia social: un fenómeno incapacitante.” Revista electrónica de psicología Iztacala 18.2 (2017): 836-851.